terça-feira, 31 de maio de 2011

Beethoven: Symphony No. 9; Handel: Organ Concerto

nviado por em 23/01/2008

UC Davis Symphony and Chorus perform works by Beethoven and Handel. Series: "Mondavi Center Presents" [11/2007] [Arts and Music] [Show ID: 12596]

Categoria:Educação

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Carl Orff: Carmina Burana

Enviado por em 07/02/2008

UC Davis University Chorus, Alumni Chorus, Symphony Orchestra, and the Pacific Boychoir perform Carl Orff's "Carmina Burana," at the Mondavi Center on the campus of UC Davis. Jeffrey Thomas, conducting, Shawnette Sulker, soprano, Gerald Thomas Gray, tenor, and Malcolm MacKenzie, baritone. Series: Mondavi Center Presents [6/2007] [Arts and Music] [Show ID: 11787]

Categoria: Educação

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sábado, 21 de maio de 2011

OS CAMINHOS DA MEMÓRIA E INCONSCIENTE COLETIVO :JUNG e Bergson




Alessandra Garrido Sotero da Silva 
Doutoranda em Teoria Literária / UFRJ 
A memória é um tema muito estudado 
por diversos ramos da ciência; entre eles,
a psicologia, a sociologia, a medicina e a literatura.

Neste capítulo, faremos um apanhado dos diversos pareceres sobre o tema, de maneira interdisciplinar, sempre tendo como eixo norteador a literatura. Logo, faremos uma trajetória do conceito de memória e suas implicações. 
 
Observa-se que a temática memória não é nova, pois segundo registros, desde a antiga Grécia já se tratava disso. 

A palavra “Memória”vem do grego Mnemosyne , 
que se tratava de uma deusa 
que presidia a função memorialística. 

O poço de Mnemosyne fazia os mortos, que dele bebiam, relembrar suas vidas, o oposto do poço de Lethe , que os fazia esquecer. Na tese de doutorado do professor doutor Antônio Jardim, Música, vigência do pensar poético, encontramos algumas reflexões sobre a etimologia desta palavra (1997: 152): 
A palavra memória provém do grego que diz, 
mais imediatamente, ação de lembrar, 
o lembrar ele mesmo, aquilo que permanece no espírito /.../ 
pode-se entender memória como instância de inventar,
meditar, refletir e velar, no sentido de cuidar, a unidade.

Na página 152, Jardim lembra que devido à concepção ontológica, a memória pode ser vista como “um fator constituidor da tentativa de imortalização”. Logo, podemos dizer que nessa primeira visão relatada a memória tem o sentido de “vir à tona” o que estava submerso no espírito, com o efeito de cuidar, imortalizar. 
 
Henri Bergson (1859-1941), filósofo francês, escreveu um livro indispensável para quem se detém nos estudos sobre memória, Matéria e memória ( 1896)

Como o próprio define no prefácio da 7 a edição, o livro afirma:
  
"a realidade do espírito, a realidade da matéria, 
e procura determinar a relação 
entre eles sobre um exemplo preciso, 
o da memória” 
(1999: 01). 
 
A sua proposta de reflexão começa a partir da leitura do mundo através de imagens e a apreensão desse mundo através do corpo. Assim, Bergson acredita que a totalidade do universo jamais pode ser completamente decifrada pelo homem, pois o seu instrumento de raciocínio é uma parte dele, como se observa nesse trecho (1999: 13-14): 
/.../ o cérebro é uma imagem,
os estímulos transmitidos pelos nervos sensitivos
e propagados no cérebro são imagens também/.../ 
é o cérebro que faz parte do mundo material, 
e não o mundo material que faz parte do cérebro/.../ 
Nem os nervos nem os centros nervosos podem, 
portanto condicionar a imagem do universo.
 
Tendo como ponto de partida essas considerações, nota-se que Bergson não compartilhava de algumas correntes intelectualistas da ciência da época, que criam que o homem poderia conhecer tudo através de sua capacidade intelectual, pois o cérebro é uma parte do mundo material também. Logo, a sua visão sobre a memória também foi revolucionária, já que afirmava a realidade do espírito, ou algo além da matéria. 

Sobre o tema, Bergson faz aproximações com a lembrança, distinguindo entre elas dois tipos (1999: 91): 
 
A lembrança espontânea 
é imediatamente perfeita,
o tempo não poderá acrescentar nada 
à sua imagem sem desnaturá-la; 
ela conservará para a memória seu lugar 
e sua data. 

Ao contrário, a lembrança aprendida sairá do tempo à medida que a lição for melhor sabida; 
torna-se-á cada vez mais impessoal/.../ 
Das duas memórias que acabamos de distinguir,
a primeira parece portanto ser efetivamente 
a memória por excelência/.../ 
 
 
Portanto, constata-se que  
Bergson acreditava (sabia)
na existência de uma memória pura, 
inalterável, que se contrapõe à lembrança
- imagem e à percepção, 
ainda que nenhuma se produza isoladamente, 
como ele afirma e em seguida as define
(1999: 155-6): 
 
A percepção não é jamais um simples contato do espírito com o objeto presente; está inteiramente impregnada das lembranças-imagens que a completam, interpretando-a. A lembrança-imagem, por sua vez, participa da lembrança-pura que ela começa a materializar e da percepção na qual tende a se encarnar.
 
Ainda sobre a memória, o filósofo afirma que 

o papel do corpo não é armazenar lembranças, 
mas simplesmente escolher, 
para trazê-la à consciência distinta. 

Assim, cria na existência de uma reserva memorialista que reside no nosso espírito e que o corpo tem o poder de acessá-la nunca de maneira completa, mas fragmentada. 
 
Ecléa Bosi, em seu livro Memória e sociedade, parte de pressupostos bergsonianos para compor a sua obra. Através dessa autora, pode-se entender de maneira clara a teoria de Bergson, como na seguinte afirmação (1999: 14): 

“Antes de ser atualizada pela consciência, 
toda lembrança vive em estado latente, potencial/.../”. 

Depois, ela completa, dizendo que: “o papel da consciência, quando solicitada a deliberar, é, sobretudo o de colher e escolher/.../“. E, finalmente, ela faz uma aproximação ao que Bergson considerava a verdadeira memória, ou lembrança-pura à arte (1999: 11):
/.../ a lembrança-pura, quando se atualiza na imagem-lembrança, traz à tona na consciência um momento único, singular, não repetido, irreversível, da vida/.../ Sonho e poesia são, tantas vezes, feitos dessa matéria que estaria latente nas zonas profundas do psiquismo, a que Bergson não hesita de dar o nome de inconsciente.
 
Através dessa concepção que Ecléa pontua, pode-se afirmar que a arte, assim como o sonho, retoma essa memória considerada verdadeira por Bergson, inatingível na sua extensão. A literatura, portanto, seria uma das “chaves” que abre a “fechadura” desse mundo oculto que vive em nosso espírito.
Outra leitura contundente que Ecléa nos traz é a caracterização da memória como força espiritual, como se lê no trecho reproduzido (1999: 16):
A memória é, para o filósofo da intuição, uma força espiritual prévia a que se opõe a substância material, seu limite e obstáculo.

A matéria seria, na verdade,
a única fronteira que o espírito pode conhecer.
 
Podemos chegar, dessa forma, ao seguinte raciocínio: se a literatura é um acesso para a memória pura e a memória é por essência espiritual, sendo a matéria uma oposição a ela; a literatura é, de certa forma, uma chave a uma categoria do espírito, ou para quem preferir, ao inconsciente. 
 
O sociólogo Halbwachs escreveu uma obra célebre, que colaborou enormemente para os estudos memorialísticos: A memória coletiva. Nele, o autor defende, como o título sugere, que a memória é um fato puramente social. Ecléa Bosi, em alguns trechos de Memória e sociedade, discute sobre a teoria deste sociólogo (1983: 17-18): 
 
Halbwachs não vai estudar a memória como tal, mas os quadros sociais da memória. Nessa linha de pesquisa, as relações a serem determinadas já não ficarão adstritas ao mundo da pessoa (relações ente o corpo e o espírito), mas perseguirão a realidade interpessoal das instituições sociais

A memória do indivíduo depende 
do seu relacionamento com a família, 
com a classe social, com a escola, 
com a Igreja, com a profissão/.../
 
O caráter livre, espontâneo, quase onírico da memória é, segundo Halbwachs, excepcional. Na maior parte das vezes, lembrar não é reviver, mas refazer, reconstruir, repensar, com imagens e idéias de hoje, as experiências do passado. A memória não é sonho, é trabalho. Se é assim, deve-se duvidar da sobrevivência do passado tal como foi, e que se daria no inconsciente de cada sujeito.
 
Halbwacs amarra a memória da pessoa à memória do grupo
e esta última a esfera maior da tradição, 
que é a memória coletiva de cada sociedade. 
(Noosfera de Chardin? Eu)
 
Observa-se, então, que para ele, a memória individual, como estudado por Bergson, é quase inexistente. Tudo aquilo de que nos lembramos e pensamos ser algo subjetivo, na verdade, é determinado socialmente. Logo, nossa memória é condicionada pela sociedade em que vivemos.
No livro A memória coletiva, Halbwachs parte do pressuposto que o homem é acima de tudo um ser estritamente social, assim, a memória não poderia se excetuar a este condicionamento, como se lê nas seguintes afirmações: 
/.../  
só temos capacidade de nos lembrar
quando nos colocamos no ponto de vista 
de um ou mais grupos e de nos situar novamente 
em uma ou mais corrente do pensamento coletivo /.../ 

É por isto que quando um homem entra em sua casa sem estar acompanhado de alguém, sem dúvida durante algum tempo esteve só, segundo a linguagem comum.Mas lá não esteve só senão na aparência, posto que, mesmo nesse intervalo, seus pensamentos e seus atos se explicam pela sua natureza de ser social, e que nenhum instante deixou de estar confinado dentro de alguma sociedade. (1990: 36-7)
 
É difícil encontrar lembranças que nos levem a um momento em que nossas sensações fossem apenas o reflexo dos objetos exteriores, no qual não misturávamos nenhuma das imagens, nenhum dos pensamentos que nos prendiam aos homens e aos grupos que nos rodeavam. Se não nos recordamos da nossa primeira infância, é, com efeito, porque nossas impressões não se podem relacionar com esteio nenhum, enquanto não somos ainda um ser social. (1990: 38)
 
Em determinado momento do livro, a partir de seus pressupostos, Halbwachs fornece a sua definição de lembrança (1990: 71):
/.../  
a lembrança é em larga medida 
uma reconstrução do passado 
com a ajuda de dados emprestados do presente,
e, além disso, preparada pra outras reconstruções 
feitas em épocas anteriores e de onde a imagem 
de outrora manifestou-se já bem alterada.
 
Segundo o nosso entendimento, não fica claro em Halbwachs a distinção entre lembrança e memória, mas o ponto de sua obra que discutiremos mais tarde é a idéia de que cada grupo social possui a sua memória específica. Nota-se, entretanto, que esse conceito é discutido pelo próprio autor (1990: 115) :
Mas a questão é então saber se os grupos, em si mesmos estão verdadeiramente separados. Poder-se-ia conceber, com efeito, não somente que eles sejam formados por numerosos empréstimos, mas que suas vidas se aproximam e se fundam geralmente, como se essas linhas de evolução se cruzassem incessantemente.
 
No trecho citado, Halbwachs se aproxima do que Jung chamou de inconsciente coletivo, do que trataremos no capitulo a seguir, buscando fazer uma aproximação desse termo jungiano ao que falaram Bergson e Halbwachs sobre a memória. 
 
Carl Gustav Jung, cujo um de seus conceitos iremos tratar a seguir, foi um psicólogo colaborador de Sigmund Freud no início do século XX. Rompeu com Freud quando criou a sua “Psicologia Analítica”, que é muito complexa para ser explicada em poucas linhas, mas pode-se dizer que uma das diferenças básicas entre esta e a Psicanálise se dá no que diz respeito ao inconsciente. 
 
Freud descobriu o inconsciente 
e Jung percebeu que só o inconsciente pessoal 
não esgotaria as questões que surgiam 
nas suas pesquisas, logo concluiu que o ser humano 
teria o inconsciente pessoal e o coletivo.

Essa teoria surgiu a partir de diversos indícios: muitos pacientes de Jung tinham visões ou sonhos (mitológicos) que não poderiam ter vivenciado e ele comparou ainda diversas sociedades tribais e não-tribais, que não tiveram nenhum contato e possuíam mitos e rituais idênticos ou muito similares. Então, concluiu que havia algo na mente do ser humano que não era individual e não poderia ser explicado só pelo grupo social em que vivia; assim, ele criou o termo inconsciente coletivo para designar uma camada mental relacionada com a totalidade, com o universo. 
 
Muitos estudiosos criticam Jung pelo interesse que tinha por assuntos cientificamente suspeitos. Na verdade, Jung valorizava o lado intuitivo do ser humano, supunha que o excesso de racionalidade poderia prejudicar o homem e assim, aproximava-se bastante da cultura oriental. À crítica relatada respondem Calvin Hall e Vernon Nordey, em Introdução à Psicologia Junguiana (1993: 19):
Jung não tratava esses assuntos como discípulo e sim como psicólogo. A questão fundamental para ele era descobrir o que esses temas revelavam a respeito da mente, sobretudo o nível da mente a que Jung dava o nome de inconsciente coletivo.
 
No livro O homem e seus símbolos, 
Jung discute a vulnerabilidade das teorias científicas, 
defendendo, de certa forma, 
o lado humano intuitivo 
 (1964:92): 
 
É uma ilusão comum acreditarmos que o que sabemos hoje é tudo o que poderemos saber sempre. Nada é mais vulnerável que uma teoria científica, apenas uma tentativa efêmera para explicar fatos, e nunca uma verdade eterna.
 
Pode-se afirmar que nesse ponto seu parecer é similar ao que lemos em Bergson, pois este também cria na incapacidade do ser humano em enquadrar tudo em esquemas experimentais. O filósofo diz, como citamos anteriormente, que o cérebro do homem, por ser uma parte do mundo material, é incapaz de esgotar a explicação do universo, que segundo ele, não se resume à matéria.
Jung, como dissemos, privilegiava a porção intuitiva do homem, considerado como um acesso ao inconsciente. Esse é um ponto fundamental, que tangencia ainda a teoria bergsoniana, e, que se opõe a Psicanálise, como explica Dante M. Leite em Psicologia e Literatura (1967: 33) : 
 
Se para Freud o inconsciente, sede dos instintos, é fonte de energia cega e destrutiva, para Jung, o inconsciente, sobretudo o inconsciente coletivo, é o depósito não apenas de impulsos, mas das idéias mais ricas e significativas da humanidade. Nesse sentido, se Freud e Jung pensam em conquistar o inconsciente, a sua intenção é oposta: para Freud, essa conquista supõe a possibilidade de estender o domínio racional às forças irracionais que tem dominado o homem; para Jung, a conquista do inconsciente não tem como objetivo o seu controle, mas a sua aceitação.
 
Como vimos anteriormente, para Bergson, a lembrança-pura era algo advindo do espírito e acessá-la era como se adentrássemos no domínio do espírito. Podemos comparar o inconsciente da psicologia ao que Bergson denominou espírito (ou uma parte dele) e a intuição, que Jung tanto admirava, às lembranças-puras.
Portanto,  
a intuição ou a lembrança-pura é 
um acesso ao inconsciente, ou, ao espírito.

Essa questão está muita associada à literatura, pois, se como lemos em Ecléa Bosi , a arte é uma forma de atingirmos a verdadeira memória, a literatura é fruto da intuição/ lembrança pura. Jung, em O homem e seus símbolos, faz uma associação entre a genialidade humana e a chamada intuição (1964: 38): 
Muitos artistas, 
filósofos e mesmo cientistas 
devem suas melhores idéias a inspirações 
nascidas de súbito do inconsciente. 

A capacidade de alcançar um veio particularmente rico deste material e transformá-lo de maneira eficaz em filosofia, em literatura, em música ou em descobertas científicas é o que comumente chamamos genialidade.
 
O inconsciente abarcaria a verdadeira memória, possível de ser acessada por escritores em suas obras grandiosas. É importante ressaltar que, o conceito de inconsciente que se presta à analogia citada é o conceito junguiano, pois não é só individual, mas também coletivo. 

A literatura seria, portanto,
obra do inconsciente coletivo. 
 
Pode-se afirmar que os estudos de Jung sobre o inconsciente e conseqüentemente sua descoberta do inconsciente coletivo constituem marco decisivo na história da Psicologia e das ciências humanas. Mas, afinal, como definir o inconsciente coletivo? Hall e Nordey, em Introdução à Psicologia junguiana, explica a terminologia da seguinte maneira (1993: 31): 
 
A mente do homem
é pré-figurada pela evolução. 
Desta maneira, o indivíduo está preso ao passado, 
não somente ao passado de sua infância, 
mas também, ao passado da espécie, 
e, antes disso, à longa cadeia da evolução orgânica.
/.../ 

O inconsciente coletivo é
um reservatório de imagens latentes, 
em geral denominadas imagens primordiais por Jung 
/.../
 
Logo, de acordo com o raciocínio estipulado até essas linhas, a nossa verdadeira memória, como chamou Bergson, aquela que sobrevive no espírito, não remonta somente as nossas experiências, mas as de nossa espécie. Assim como não podemos apreendê-la completamente, temos acesso às reminiscências dessa memória coletiva que vive em nós.
Em seu livro citado, Jung explica como chegou à terminologia inconsciente coletivo (1964: 47); 
 
Fiz várias comparações deste tipo entre o homem moderno e o primitivo. São essenciais para compreendermos a tendência do homem de construir símbolos e a participação dos sonhos para expressá-los. Pois vamos descobrir que muitos sonhos apresentam imagens e associações análogas a idéias, mitos e ritos primitivos. Estas imagens oníricas eram chamadas por Freud resíduos arcaicos. A expressão sugere que estes resíduos são elementos psíquicos que sobrevivem na mente humana há tempos imemoriais.

É um ponto de vista característico dos que consideram o inconsciente uma simples apêndice do consciente/.../ Constatei que associações e imagens deste tipo são parte integrante do inconsciente e podem ser observadas por toda parte- seja o sonhador instruído ou analfabeto, inteligente ou obtuso. 

Não são, de modo algum, resíduos sem vida ou significação.Têm, ao contrário, uma função e são, sobretudo valiosos /.../ Constituem uma ponte entre a maneira por que transmitimos conscientemente os nossos pensamentos e uma forma de expressão mais primitiva, mais colorida e pictórica. E é esta forma que apela diretamente à nossa sensibilidade e à nossa emoção. Essas associações históricas são o elo entre o mundo racional da consciência e o mundo do instinto.
 
Segundo Jung o inconsciente coletivo é formado por arquétipos, que são manifestados pelos símbolos com os quais nos defrontamos na nossa experiência humana. Arquétipo para Jung é um modelo original, um protótipo, mas não são entidades fechadas, pois segundo ele existem tantos arquétipos quanto às situações típicas da vida (1964: 69): 
 
O arquétipo é, na realidade, uma tendência instintiva, tão marcada como o impulso das aves para fazer seu ninho ou o das formigas para se organizarem em colônias/.../ Chamamos instinto aos impulsos fisiológicos percebidos pelos sentidos. Mas, ao mesmo tempo, estes instintos podem também manifestar-se como fantasias e revelar, muitas vezes, a sua presença apenas através de imagens simbólicas. São a estas manifestações que chamo arquétipos. A sua origem não é conhecida; e eles se repetem em qualquer época e em qualquer lugar do mundo- mesmo quando não é possível explicar a sua transmissão por descendência direta ou por fecundações cruzadas resultantes da migração.
 
Podemos também confirmar a idéia junguiana da existência de um inconsciente coletivo e o seu conteúdo (os arquétipos) através do que lemos em Halbwachs sobre a memória. Segundo o sociólogo, somos seres estritamente sociais e as nossas lembranças são sempre coletivas, grupais. 

Jung comprovou essa tese e foi além: percebeu que há uma universalidade entre as nossas lembranças e estas não se restringem a uma vivência pessoal, nem de um grupo, mas da espécie humana e pré-humana [1[. Falamos no capítulo anterior sobre a lacuna que propositalmente deixa Halbwachs em seu livro na última citação feita. Ele questiona se os grupos estão verdadeiramente separados, evidentemente por causa das diversas misturas culturais existentes. 

Entretanto, o sociólogo crê que são resultantes de empréstimos provocados com possíveis convivências e Jung anula, através de suas pesquisas, essa possibilidade, pois constata que algumas recordações não eram passíveis de algum contato, advinham verdadeiramente de um elo que concatena os seres, chamado por Freud de resíduos arcaicos. Como lemos na afirmação de Jung, essas imagens não eram resíduos sem uma delimitada origem como disse Freud, mas advinham do inconsciente coletivo.

Essa idéia preenche exatamente a lacuna deixada por Halbwachs, evidenciando que o nosso inconsciente é pessoal e coletivo. Portanto, o que lembramos pode ser fruto de nossa vivência individual, social ou de reminiscências de vivências de outros da nossa espécie, havendo, portanto, o liame da evolução. 
Fonte:
Revista Garrafa
http://www.letras.ufrj.br/ciencialit/garrafa11/v1/alessandragarrido.html

Sejam felizes todos os seres. Vivam em paz todos os seres.

Sejam abençoados todos os seres.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

HENRI BERGSON - Ana Lúcia Santana



O filósofo e diplomata francês Henri-Louis Bergson nasceu em Paris, no dia 18 de outubro de 1859, fruto da união de pais judeus, a mãe de procedência inglesa e o pai polonês. Apesar de ter vivido algum tempo na cidade de Londres, ele voltou para Paris aos nove anos, aí assumindo a cidadania francesa. 

Sua educação foi realizada na França, e neste país ele se licenciou em Letras, apesar de seu incrível talento para as disciplinas científicas. Em 1881 ele inicia o magistério, lecionando em Angers e, posteriormente, em Clermont, até regressar para sua terra natal em 1889. Na cidade-luz ele ministra aulas no Liceu Henri 4º, na École Normale Supérieure e no Collège de France, no qual ele ingressa depois de se doutorar em Letras pela Universidade de Paris, defendendo tese sobre o filósofo Aristóteles. Neste Colégio suas aulas são disputadas, seu trabalho conquista um sucesso nunca antes igualado.
A partir de 1901 ele passa a integrar o Instituto de França, tornando-se membro da Academia Francesa em 1914. 

Famoso especialmente pela publicação de suas obras Matière et mémoire, de 1896, e L’Évolution créatrice, lançada em 1907, investigada até hoje nas mais distintas esferas, no cinema, na literatura, na neuropsicologia, entre outras mais, ele obtém em 1927 o Prêmio Nobel de Literatura. Um reumatismo crônico, que depois de 1925 passa a deformar seu corpo, o impede de receber esta premiação em Estocolmo. 

Este pensador defende idéias fundamentais para o desenvolvimento da filosofia moderna, as quais são amplamente absorvidas por todos, assumindo assim um caráter popular sem precedentes, quando Bergson ainda se encontrava vivo.

Ele sobrepõe seu ponto de vista biológico à tradicional concepção materialista da Ciência e da Metafísica, encerrando desta forma o reinado da visão de Descartes. 

Seus conceitos estão perfeitamente sintonizados com o Positivismo vigente no século XIX e com o processo de espiritualização em voga na França, com os quais tenta empreender uma síntese dialética, distinta, porém, da de Hegel, procurando assim transcender o ideal positivista. 

No ápice do desenvolvimento científico, 
este filósofo atinge o cerne da polêmica interação
entre a Ciência e o conhecimento metafísico, 
ou seja, entre a realidade do organismo físico 
e a existência social e mental.

Ele batiza sua metafísica pessoal de ‘positiva’, atribuindo a esta expressão um sentido único, semelhante ao que concede à concepção de ‘dado imediato’, e gera um novo modelo de pensamento. 

O desejo de Bergson é inserir
nas esferas das Ciências Humanas e da Religião 
os elementos positivistas, utilizando para isso
uma ferramenta essencial, a evolução.

Ele defende que a realidade vivenciada pelo Homem é a duração real, a qual se desenrola na consciência, neste cenário em que se conectam a experiência e a intuição, esta representando o núcleo central da vivência genuína, a ação intensa que define a durabilidade do real. 

Segundo este pensador, 

o ser humano tem o poder de transcender
a esfera do inteligível, preservando o ímpeto criativo
para assim vencer a face paralisante da moral 
e da religião, até exceder os limites 
do que ele chama de élan vital, o estímulo vital 
que provém de Deus, 
se não é ele mesmo a própria divindade. 

Bergson defende, assim, quatro conceitos básicos, a ‘intuição’, a ‘durée’, a memória e o élan vital, aqui descritos sucintamente. 

Henri Bergson morre no dia 4 de janeiro de 1941, em Paris, ao longo da ocupação nazista na França, depois de se converter ao catolicismo.
Fonte:
InfoEscola
http://www.infoescola.com/biografias/henri-bergson/

Sejam felizes todos os seres. Vivam em paz todos os seres.

Sejam abençoados todos os seres.

VIDA E CRIAÇÃO : A RELIGIÃO EM BERGSON

Henri-Louis Bergson

Marco Antonio Barroso[1]

 
Louis-Henri Bergson (1859-1941) 
é considerado uma das maiores figuras da filosofia 
entre os fins do século XIX e 
a primeira metade do século XX. 

Fez parte de um seleto grupo de pensadores que iniciaram a transição entre a filosofia moderna e a contemporânea, como os filósofos alemães F. Nietzsche (1844-1900), E. Husserl (1859-1929) e W. Dilthey (1883-1911), o americano W. James (1842-1930), ou o francês G. Bachelard (1884-1962).

Foi provavelmente 
o maior filósofo espiritualista francês. 

Durante algum tempo, sua obra ficou um tanto quanto esquecida nos meios acadêmicos, todavia, em fins do último século, algumas figuras, antes sumidas do cenário filosófico, começaram a ser retomadas e, entre elas, encontra-se o citado filósofo[2]. Como afirma Pondé, em introdução ao livro A intuição e a mística do agir religioso, “Bergson participou da ‘virada’ fenomenológica no início do século XX, e é, de certa forma, um Husserl à la française. Seu chamado a um retorno aos ‘dados imediatos da consciência’ é na realidade uma atitude filosófica crítica. No entendimento de Bergson, 

a experiência pura da consciência 
não oferece o mesmo conteúdo 
que a elaboração inteligente nos dá”[3]


Sobre a origem do pensamento de Bergson, podemos afirmar que ela se encontra enraizada em duas fontes. Uma seria a de seus mestres acadêmicos, e que podemos flagrar na obra do próprio autor, em suas dedicatórias, notas e textos biográficos. A outra fonte vem de sua origem etnológica, em suas raízes judaicas[4]. Mesmo no final de sua vida, atraído pela mística cristã, podemos capturar em Bergson suas raízes judaicas. O cristianismo, pensado por Bergson, é o desenvolvimento do judaísmo. 

Cristo é um continuador
da obra dos profetas de Israel.

Segundo Léon Foucks[5], um estudo mais aprofundado da filosofia bergsoniana levaria à descoberta de analogias profundas entre o pensamento judaico e a obra do autor francês. Suas concepções seriam muito mais próximas à tradição israelita do que à cristã. Para Bergson, o místico completo é aquele pelo qual Deus ama a humanidade[6]

Um Deus universal, que é puro amor,
é o que pretende Bergson, 
assim como o Deus universal do judaísmo, 
completado pelos ensinamentos do profeta Jesus.

Trata-se de uma concepção muito próxima ao pensamento do pensador semita Leão Hebreu (+ 1460-?), Jehuda Abravanel, que, em sua obra Diálogos de Amor, tem uma concepção unificadora do universo, animada pelo princípio do amor[7]
Ou ainda  
Baruch Spinoza, que, em seu panteísmo, 
unifica a totalidade do mundo na idéia de Deus

E, embora contrário ao pensamento imobilista de Spinoza, Bergson preserva a unidade do universo em sua concepção de Deus. A divindade seria um centro do qual jorraria a vida, um centro de contínua mobilidade e liberdade. Assim é Deus definido para Bergson[8].
Pela parte do ensino de seus mestres, podemos captar, na obra do próprio autor, as grandes influências que lhe forneceram a forma para revestir sua intuição criadora. 

Não podemos esquecer que Bergson é herdeiro de uma geração que sofreu o impacto, direta ou indiretamente, da revolução francesa.

Ou, conforme Melónio[9], do “período de críticas à filosofia das luzes”. E pode-se dizer, também, que é tributário do período de crítica ao positivismo materialista, legatário do pensamento iluminista. Nesta reação encontramos, num primeiro momento, a filosofia que seria o pensamento “oficial” do novo Estado francês, o ecletismo espiritualista de Victor Cousin. Em um segundo momento, há o movimento espiritualista propriamente dito. E é neste último que Bergson irá beber suas influências. 

Em sua obra Ensaio sobre os dados imediatos da consciência, Bergson inicia com uma homenagem a Jules Lachelier (1834-1919), então inspetor-geral da instrução pública. Lachelier e Émile Boutrox (1845-1921) “fazem do estudo da obra de Kant uma obrigação em seus cursos, malgrado o peso exercido pelos positivistas”[10]. O primeiro tenta fundar a filosofia espiritualista em uma metafísica, usando do pensamento kantiano para corrigir os erros encontrados por ele no ecletismo de Cousin. Apesar de sua pouca originalidade, pode-se afirmar que é em Lachelier que o espiritualismo se separa do ecletismo e ganha corpo próprio. De Boutrox,
Bergson herda a idéia de que a vida humana 
é irredutível à vida puramente orgânica. 
“A consciência de si,
a reflexão sobre os próprios modos de ser, 
a personalidade não podem ser reduzidas 
a nenhum outro elemento.”

Mas é em O Pensamento e o movente que encontramos, descritas pelo próprio autor, suas fontes. Na citada obra, o pensador francês transcreve uma homenagem àquele que o antecedeu na Académie des sciences morales et politiques, Jean-Gaspard-Félix Laché Ravaisson[12] (1813-1900). Em suas duas principais obras, Ensaio sobre a metafísica de Aristóteles e Do Hábito, Bergson tira inspiração para aquele que, mais tarde, se constituiria em seu método filosófico, ou seja, o intuicionismo. Para nosso autor, Ravaisson sugere uma filosofia de introspecção que propiciaria ao filósofo que a praticasse um estado de coincidência com a realidade em si mesma, além da aparência exterior que as coisas a seu redor ensejariam. A nova visão se nos apresentaria “como um dom gratuito, como um grande ato de liberdade e de amor”[13]

Das formas mais elementares existentes às mais complexas, ela descobriria uma ordem, uma aspiração que ligaria o inferior ao superior. Esta filosofia se coloca em oposição a uma filosofia de cunho meramente analítico e materialista, que, na decomposição dos elementos, chega apenas a partes mortas do que na verdade é, um complexo vivo e mutável. Assim, entre o iluminismo herdado pelo positivismo e o espiritualismo ecletista, aparece a mediação bergsoniana, realizando uma “superação simbiótica” entre os dois extremos. “Do positivismo à metafísica”, essa seria a trajetória sugerida por Juan M. Navarro e Tomas C. Martinez em seu livro História da Filosofia[14].
 
Devemos entender o procedimento investigativo bergsoniano como a tentativa de abordagem sistemática da relação entre o conhecimento científico e o metafísico. É na sistematização dessas idéias que surge a obra bergsoniana. Em Ensaio sobre os dados imediatos da consciência (1888), o autor desenvolve sua idéia de duração como tempo qualitativo. 

Em 1896 vem a público Matéria e Memória. Aí temos a revelação do estado de duração como vida em seu sentido ontológico. Nessa obra, o tempo (durée) é compreendido como memória. Em A evolução criadora (1907), temos o élan vital, que percorre a evolução, desembocando uma de suas correntes no homem – cosmologia, epistemologia e metafísica se tocam na busca pelo élan vital. E, em 1932, Bergson toca finalmente, de forma explícita, o problema que esteve implícito em toda a sua filosofia, o da religião.

Afirmamos isto, pois em resposta à acusação de ateu, proferida pelo Pe. Tonquédec, ele diz, se defendendo, que as considerações expostas em seu “Essai sur les données immédiates apresentam o fato da liberdade; as de Matière et mémoire fazem tocar com a mão a realidade do espírito; as de L’evolution créatice apresentam a criação como um fato: de tudo isso brota a idéia de um Deus criador e livre, gerador ao mesmo tempo da matéria e da vida, cujo esforço de criação prossegue, da parte da vida, como a evolução da espécie e com a constituição das personalidades humanas.”[15]
  
Com essa afirmação do autor, precisamos, então, enxergar toda a filosofia bergsoniana como um pensamento não ateu, desenvolvido em torno de uma idéia dinâmica da divindade e da própria espiritualidade humana e, a nosso ver, fundamentada em sua metafísica do tempo. Ao ensejo desta colocação, podemos entender a filosofia de Bergson como um projeto que tem o cume em sua obra As duas fontes da moral e da religião

Trata-se de um trabalho em que o autor desenvolve suas idéias de filosofia social, moral e da religião. Isto porque é sobre sua conceituação de religião que o pensador apóia suas idéias de filosofia social e moral. É este mais além que almejamos pôr às claras em nossa proposta de pesquisa. Buscar as raízes de possibilidade do fenômeno religioso no pensamento de Bergson, e suas conseqüências. Mas esta busca só seria possível, a nossos olhos, usando a duração como instrumento de leitura de toda filosofia bergsoniana. 

Ao ensejo de alcançar o objetivo esperado teríamos, pois, que, primeiramente, definir o que o filósofo francês entende por duração. Dedicamo-nos, então, ao estudo dessa idéia na filosofia bergsoniana. Ao longo do período em que pesquisamos o conceito de duração, na obra bergsoniana, mais clara se tornava a necessidade de que, também, deveríamos entender o método do qual o nosso filósofo faz uso em sua investigação sobre o tempo.

Concluída nossa pesquisa sobre o conceito de duração, partimos para o entendimento da intuição, ou do método intuitivo bergsoniano, dito de outra forma.
Para um melhor arranjo metodológico e para melhor fluência da leitura da pesquisa, decidimos inverter a apresentação dos dois conceitos referidos acima no primeiro capítulo de nossa dissertação. 

Em primeiro lugar, expusemos o método bergsoniano: a intuição. Com seu método, Bergson propõe uma nova epistemologia, na qual a realidade deve ser abarcada num todo indiviso e móvel. 

Intuir é captar a realidade em um “golpe de vista”,
antes mesmo de sua racionalização. 

Para nosso autor, a filosofia não deveria encaixar o mundo em conceitos previamente construídos, mas sim criá-los, um a um, após a observação da vida. 

Só pela intuição poderíamos captar, 
de forma supra-intelectual, 
o verdadeiro movimento da vida,
ou seja, a duração. 
Como já exposto anteriormente[16]

Bergson considera que a idéia de duração está na base de toda a sua construção filosófica. A duração é a própria constatação da passagem do tempo, mas de uma passagem que deixa suas marcas, trazendo mudanças que, embora radicais, parecem imperceptíveis. 

E cada instante é um instante inteiramente novo, uma vez que entendemos o tempo como duração. Isto porque, a cada momento da vida, todo um passado de experiências já vivenciadas vem se reunir, não permitindo, assim, que um mesmo fato nunca se repita da mesma forma. Logo a vida se torna para aquele que a observa perpétua criação e liberdade. 

Terminada a primeira etapa de nossa pesquisa tínhamos a necessidade de criar uma ponte conceitual que nos possibilitasse chegar à sua outra margem, a religião como entendida por Bergson. Nesta segunda etapa, que expusemos no segundo capítulo, a duração assumiria outra denominação, todavia mantendo as mesmas características.
Élan vital é como Henri Bergson conceitua a duração em seu livro A evolução criadora. Nesse livro, o filósofo francês, usando de seu método, transfere a pesquisa em torna da duração para o mundo exterior a nosso eu. 

O élan vital é o próprio impulso criador 
que perpassa a natureza, dando forma e vida à matéria amorfa. Nesta obra bergsoniana, já podemos encontrar algo de sua filosofia da religião, pois, como afirma o autor, 

é da própria criação, 
de um Deus criador e livre 
que fala seu livro. 

Nesse capítulo de nosso trabalho, apresentamos as bases epistemológicas do pensamento bergsoniano, tal qual a revisão que o espiritualismo bergsoniano propõe para o positivismo e a ligação de nosso autor com a ciência de sua época. Sua busca por um parâmetro de pesquisa baseado no que o autor denomina de “biologia em sentido mais compreensivo”[17]; a concepção bergsoniana da gênese da matéria e da inteligência; a ação criadora do élan vital, da forma de vida mais rudimentar ao ser humano.

E por último, a relação entre a filosofia bergsoniana e o pensamento de Plotino, em que fica evidente a aproximação do élan vital, de Bergson, ao conceito do Uno plotiniano. 

Restava então à última parte de nossa pesquisa identificar a duração no pensamento bergsoniano sobre a religião. Como frisa Frédéric Worms[18], a filosofia bergsoniana se constrói sobre o paradoxo tempo (duração) vs. espaço.
 E na filosofia religião proposta pelo nosso autor, esse paradoxo não poderia estar ausente. 

No livro As duas fontes da moral e da religião, encontramos o paradoxo do aberto e do fechado, do dinâmico e do estático. A uma religião dinâmica encontramos vinculada uma sociedade aberta; a uma religião estática encontramos ligada uma sociedade fechada. Essa divisão feita por Henri Bergson não pode, de fato, ser considerada nova, pois já a encontramos cerca de um século antes no pensamento de outro filósofo francês, Benjamin Constant de Rebecque[19].

O que podemos dizer que há de novo no pensamento bergsoniano é o lastro que este cria entre a religião do sentimento, dinâmica, e a vida. Direcionamos então nossos estudos sobre aquela forma de religião que, para Bergson, se identifica com a duração e a vida, a religião dinâmica

Para compreendermos a religião no pensamento bergsoniano, é necessário que primeiramente entendamos a mística, ou o que o autor francês caracteriza de verdadeiro misticismo

Assume o misticismo o papel da intuição, podemos mesmo qualificá-lo como a intuição em seu máximo grau. Esta intuição é o móvel da ação humana, nos mais variados campos, é o que nosso autor denomina de emoção criadora. Essa seria a faculdade que realmente nos leva ao conhecimento, no campo das ciências; que nos possibilita a experiência estética, no campo da arte; e que gera o herói, no campo da moral. 


No entender do autor francês, 
os verdadeiros místicos são aqueles
homens e mulheres de ação que, 
sentindo a ação criadora da vida (de Deus), 
tornam-se também parte dessa ação.

A religião dinâmica é, para Bergson,
aquela que deriva da atitude dos grandes místicos 
que transmutam o élan vital em amor 
e fazem com que a humanidade evolua.

Assim como em A evolução criadora, o élan vital impulsionava a evolução das formas de vida. Em As duas fontes da moral e da religião, encontramos o mesmo impulso movendo as formas de organização da humanidade. 

A religião dinâmica é,
no entendimento bergsoniano, 
o móvel da mais pura forma de moral,
a moral aberta. 

O verdadeiro místico proporciona, com sua ação, que aqueles que o cercam sejam tocados em sua mais íntimas fímbrias pela vontade de agir no bem. É uma moral supra-intelectual, a mesma que movia os primeiros mártires cristãos que, a caminho da morte, entoavam canções. 

Se entendermos o termo religião, em sua etimologia, por religare, ou seja, aquele ato que religa o homem à sua origem, a Deus, poderemos entender toda a obra bergsoniana como uma filosofia religiosa. Isto porque, como pudemos ler, o autor nos incita ao ato de introspecção, que, em etapas, nos religa ao élan criador; à vida, que é o ato criador contínuo do Ser supremo; ao amor divino, que é na verdade o próprio Deus.

Situando o homem na natureza, 
Bergson procura indicar-nos, com sua filosofia, 
que podemos ir mais além do que pensamos ser capazes.

Podemos dizer que o que o pensador francês buscou com suas obras foi uma filosofia da bem-aventurança. Onde procurávamos um filósofo da religião, achamos um místico da vida. 
 
Podemos entender ainda o pensamento bergsoniano sobre a religião como uma fenomenologia, certamente não em seu sentido restrito, mas em uma acepção mais aberta. Encontramos em Bergson aquele desejo de conhecer a natureza do fenômeno religioso e sua essência, própria do fenomenólogo da religião[20].

Analisando as chamadas grandes religiões, ou mesmo a filosofia clássica, o autor francês encontrou aquela que seria a estrutura básica, no seu entender, do fenômeno religioso: o misticismo, que é a característica que assume o élan da vida em seu mais alto grau nos domínios humanos. Dota Bergson, assim, a própria vida com o dom da sacralidade.

Uma vez sendo a vida
em sua totalidade “sagrada”, 
nosso autor pode excluir essa categoria 
de seu vocabulário, pois tudo é criação da vida, 
se não é sua própria manifestação.
Falar da vida é já falar do sagrado


Referências Bibliográficas
BERGSON, Louis-Henri. Cartas, conferências e outros escritos. São Paulo: Abril Cultural, 1974.
______. Cursos sobre a filosofia grega. São Paulo: Martins Fontes, 2005.
_____. Ensaio sobre os dados imediatos da consciência. Lisboa: Edições 70, 1988.
_____. La pensée et le mouvant. Paris: PUF, 1946.
_____. Les deux sources de la morale et da religion. Paris: PUF, 1951.
_____. L’énergie spirituelle. Paris: PUF, 1967.
_____. L’évolution creatice. Paris: Félix Alcan, 1930.
_____. Matéria e memória. Tradução Paulo Neves. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
_____. Memória e vida. Tradução Claudia Berliner. São Paulo: Martins Fontes, 2006.

Vida e Criação: A Religião em Bergson

Resumo da dissertação com o mesmo nome 
[1] Mestre em Ciência da Religião/Filosofia da Religião
pela UFJF-MG, 
Doutorando em Ciência da Religião/Filosofia da religião
pela UFJF-MG. 
Fonte:
Notas de Rodapé
http://www.notasderodape.com.br/index.php/filosofia/vida-e-criao-a-religio-em-bergson.html
 
Sejam feliozes todos os seres  Vivam em paz todos os seres
Sejam abençoados todos os seres.