quarta-feira, 11 de maio de 2011

HENRI -LOUIS BERGSON - PENSAMENTO- VIDA E EVOLUÇÃO


HENRI BERGSON
por 
J. M. Bochenski

       A.PROCEDÊNCIA E PARTICULARIDADES.
HENRI BERGSON (1859-1941) é o representante mais conceituado e originalda nova "filosofia da vida", a qual dele recebeu a forma mais acabada.Contudo, embora mais tarde se tenha posto à testa do movimento, não se podedizer que tenha sido ele o seu fundador. Na própriaFrança, a Action de BLONDEL precedeu o Essai sur lesdonnées immédiates deIa conscience de BERGSON. e também LEROY, que mais tarde seria discípulo de BERGSON, já anteriormente se haviamanifestado contra o mecanicismo.

Todo este movimento está em relação coma tendência espiritualista, voluntarista e personalista da filosofia francesa,que, iniciada por MAINEDE BIRAN, foiem seguida representada por Félix RAVAISSON-MOLLIEN (1813-1900),JULES LACHELIER (1832-1918) e ÉMILE BOUTROUX (1845-1921), de quem BERGSON foi discípulo.

Contudo,BERGSONnão se deixou ifluenciar somente por estes filósofos,mas também pela "critica da ciência". Além disso, tomou igualmentemuitas idéias das teorias evolucionistas e utilitaristas inglesas; ele próprioconfessa que, de início, só a filosofia de HERBERT SPENCER lhe parecia ajustar-seà realidade, e sua própria filosofia proveio da tentativa de aprofundar osfundamentos do sistema spenceriano.

Contudo,semelhante tarefa levou-o finalmente a repudiar completamente o spencerismo, que não cessou de combater daí em diante. A atividade especulativa de BERGSONexerceu-se,sobretudo, em quatro obras que mostram claramente sua evolução espiritual.O Essai sur les données immédiatesde Ia conscience (1889) contém a sua teoriado conhecimento; Matière et Mémoire (1896) sua psicologia,L’Évolution créatrice(1907) sua metafísica fundada na biologia especulativa, Lesdeux sources de la Morale etde la Religion (1932)sua ética e filosofia da religião.

Todas estas obras tiveram êxitoextraordinário, que se explica não só porque BERGSON expunha uma filosofiarealmente nova e que correspondia às necessidades mais prementes da época,mas também porque a exprimia numa linguagem de rara beleza. Por esse motivo lhe foi atribuído, em 1927, o prêmio Nobel de literatura. 

A uma prodigiosa clareza, a uma artística matização das expressões e a uma impressionante potênciade imaginação, alia ele extraordinária gravidade filosófica e uma acuidadedialética sem par. Além disso, suas obras apóiam-se em conhecimentos sólidos,adquiridos à custa de amplas e árduas pesquisas. Por tudo isto, BERGSONfoi capazde superar, a um tempo, o positivismo e o idealismodo século XIX. É um dos pioneiros do espírito novo de nosso tempo.

B. DURAÇÃOE INTUIÇÃO.
Segundoa concepção do senso comum, admitida igualmente pela ciência, as propriedadesdo mundo são a extensão, a multiplicidade numérica e o determinismocausal. O mundo compõe-se de corpos sólidos extensos, cujas partes seencontram espacialmente justapostas; é caracterizado por um espaço totalmentehomogêneo e por separações precisas, e todos os acontecimentos sãode antemão determinados por leis invariáveis. 

A ciência da natureza nuncaconsidera o movimento, mas só as posições sucessivas dos corpos; nunca asforças, mas só os seus efeitos; a imagem do mundo traçada pela ciência naturalcarece de dinamismo e de vida; o tempo, tal como o encara a ciência, não é,em última instância, senão espaço; e quando a ciência natural pretende mediro tempo, na realidade não mede senão o espaço.

Todavia,podemos descobrir em nós mesmos, embora com esforço, uma realidade inteiramentediferente. Esta realidade possui uma intensidade puramente qualitativa,compõe-se de elementos absolutamente heterogêneos,que, entretanto, se interpenetram, de sorte que não é possível discriminá-losclaramente uns dos outros; e, por último, esta realidade interior é livre.Não é espacial nem calculável; de fato, não somente ela dura, senão que é duração pura,e, como tal, completamente diferente do espaço e do tempo das ciências danatureza. É um agir único e indivisível, umalor (élan) e um .devir que não pode ser medido. Esta realidadeencontra-se, em principio, em constante fluir, nunca é, mas perpetuamentedevém.

A faculdade humana que corresponde à matéria espacial é a inteligência, e esta caracteriza-se por sua exclusiva orientação para a ação.É a ação que comanda, sem mais, a forma da inteligência.Como para a ação necessitamos de coisas exatamente definidas, o objeto principalda inteligência é o fixo corpóreo, inorganizado,fragmentário; a inteligência não concebe claramente senão o imóvel. Seu domínioé a matéria. Ela a capta para transformar os corpos em instrumentos; é o órgãodo homo faber e subordinado, essencialmente,à construção de instrumentos. 

Dentro do domínio da matéria e graças à sua afinidade essencial com a matéria, a inteligência não só capta os fenômenos,como também a essência das coisas. BERGSON abandonao fenomenismo de KANTe dospositivistas, e confere à inteligência, no domínio do corpóreo, a capacidadede penetrar na essência das coisas. Segundo ele, a inteligência é também analítica,ou seja, capaz de decompor segundo qualquer lei ou sistema e de recompor de novo. Suas características são a clareza e a capacidade de distinguir.

Mas, ao mesmotempo, a inteligência caracteriza-se igualmente pelo fato de, por natureza,lhe ser impossível compreender a duração real, a vida. Constituída de acordocom a matéria, ela transfere as formas materiais, extensivas, calculáveis,claras e determinadas, ao mundo da duração; interrompe a corrente vital únicae introduz nela a discontinuidade, o espaço e anecessidade. Não pode sequer comprender o simplesmovimento local, como o provam os paradoxos de ZENÃO.

Só podemosconhecer a duração graças à intuição;mas com ela conhecemo-ladiretamente e como algo íntimo. A intuição distingue-se por característicasque se contrapõem às características da inteligência. Órgãodo homo sapiens, a intuição não está ao serviço da prática; seuobjeto é o fluente, o orgânico, o que está em marcha; só ela pode captar aduração. Enquanto a inteligência analisa, decompõe, para preparar a ação,a intuição é uma simples visão, que não decompõe nem compõe, mas vive a realidadeda duração. Não se adquire facilmente a intuição; tão habituados estamos aouso da inteligência que se torna necessária uma viragemíntima violenta, contrária a nossas inclinações naturais, para podermos exercitara intuição, e só em momentos favoráveis e fugazes somos capazes de o fazer.

Em resumo, existem doisdomínios: de um lado, o domínio da matéria espacial e rígida, subordinadoà inteligência prática; de outro lado, o domínio da vida e da consciênciaque dura, ao qual corresponde a intuição. Sendo aatitude da inteligência exclusivamente prática, a filosofia não pode utilizarsenão a intuição. Os conhecimentos, obtidos por este meio, não podem ser expressosem idéias claras e precisas, nem tampouco são possíveis asdemonstrações. A só coisa, que o filósofo pode fazer, é ajudar os outros aexperimentarem uma intuição semelhante à dele. Assim se explica a riquezade imagens sugestivas que as obras de BERGSON oferecem.

      C. TEORIA DO CONHECIMENTO E PSICOLOGIA.
BERGSON aplicou seu método intuitivo em primeiro lugar aos problemasda teoria do conhecimento. Tais problemas, diz ele, receberam até ao presentetrês soluções clássicas: o dualismo corrente, o kantismo e o idealismo.

Contudo,estas três soluções estribam totalmente na falsa afirmação de que a percepçãoe a memória são puramente especulativas, independentes da ação, quando narealidade são completamente práticas, subordinadas à ação. Por suavez, o corpo não é mais do que um centro de ação. Destes princípios se infereque a percepção não abarca senão uma parte da realidade; ela consiste, defato, numa seleção de imagens, das que são necessárias para cumprir a ação.

O idealismo engana-se; os objetos, de que o mundo se compõe, são "imagens verdadeiras" e não únicamente elementos da consciência. Tanto o realismo habitualcomo o de KANT cometemerro ainda maior, ao situarem entre a consciência e a realidade exterior oespaço homogêneo, que consideram como indiferente.De fato, o espaço é só uma forma subjetiva, em correspondência unicamentecom a ação humana.

BERGSON consolida sua teoria do conhecimento
mediante uma psicologia definida. 

Em primeiro lugar, repudia o materialismo, quetira toda sua força do fato de a consciência depender do corpo – como se,do fato de um vestido oscilar e cair com o gancho a que está suspenso, tivéssemosde concluir que o vestido e o gancho são idênticos. Entre os fenômenospsicológicos e os fisiológicos não existe sequer um paralelismo, o qual, aliás,nada provaria.

A prova disto é a memória pura. Com efeito, importa distinguirdois tipos de memória: umamemória mecânica, corporal, que consiste unicamente na repetição de umafunção tornada automática, e a memória pura, que reside nas imagens da lembrança.Neste caso, não se pode falar de uma localização no cérebro, argumentoprincipal aduzido pelos materialistas. Se houvesse uma tal localização exata,deveriam perder-se porções inteiras da memória por causa de certas lesõescerebrais; na realidade muitas vezes só se verifica um enfraquecimento geralda memória.

Mais acertadamente talvez se pudesse comparar o cérebro a umaespécie de gabinete destinado a transmitir sinais. Sua função não é a vidapropriamente espiritual. Por seu turno, a memória não é uma percepção atenuada,mas um fenômeno essencialmente diferente.

A psicologia associacionista estriba no duplo erro de concebera duração como um espaço e o eu como um conjunto de coisas decalcadas pelamatéria. Estes mesmos erros conduzem ao determinismo psicológico, queconcebe os motivos como coisas simultâneas e o tempo como um caminho no espaço,donde se infere, naturalmente, a negação da liberdade. Na realidade, nossasações provêm de nossa personalidade toda; a decisão cria algo de novo, o atosai do eu, unicamente do eu e, portanto, é inteiramente livre. O fato de aliberdade ser negada tão freqüentemente, apesar de sua evidência imediata,deve-se a que a inteligência forma um eu superficial, análogo ao corpo, eencobre dessa maneira o eu real mais profundo, que não é senão criaçãoe duração.

     D.VIDA E EVOLUÇÃO.
As duas doutrinas clássicas, pelas quais se pretendeu explicara vida, a mecanicista e a teleológica, erram por igual, vistoambas negarem radicalmente a duração. Segundo a primeira, o organismo é umamáquina de antemão determinada porleis calculáveis, e, de acordo com a segunda, existe um plano acabado do mundo.Ambas, sob certo aspecto, ampliam demasiado a noção de inteligência;a inteligência é para operar e não para conhecer a vida. A filosofia precisasuperar estas duas doutrinas, especialmente o mecanicismo que nega simplesmentefatos evidentes.

      Do mesmo modo que no problemapsicofísico, também no problema da vida é possível observar um fenômeno quemostra a falsidade do mecanicismo. Este fenômeno consiste na produção de órgãosestruturalmente análogos em linhas evolutivas muito diferentes; assim, porexemplo, o olho nos moluscos e nos vertebrados, cujas linhas de evolução devemter-se separado muito antes do momento em que adquiriram a vista. Servindo-sedeste fato e de muitas outras observações, BERGSONrepele o mecanicismo darwinistae neodarwinista e, em geral, a concepção mecanicistado órgão vivo. 

O órgão vivo deve ser considerado como a expressão complexade uma função simples; pode ser comparado a um quadro composto demilhares de traços, mas que expressa a inspiração simples do artista. Sem dúvida, o organismo contém um mecanismo, parece até ser um mecanismo. Mas assim como num arco dividido em minúsculos segmentos, estes segmentos coincidemaparentemente com a tangente, assim também a vida examinada em suas minúcias com os métodos das ciências da natureza parece ser um mecanismo, mas não o é.

      A vida como um todo não é nenhuma abstração.
Em determinado momento surgiu em certos lugares do espaçouma corrente vital que, através dos organismos desenvolvidos, vai passandode um germe a outro. A corrente vital procura vencer os obstáculos que a matérialhe opõe; a materialidade de um organismo representa a totalidade dos obstáculoscontornados pela vida. 

A vida não procede logicamente, erra de quando em quando,acumula-se em becos sem saída ou até volta para trás. Contudo, o ímpeto vitalgeral persiste. A fim de poder desdobrar-se, o alorvital (élan vital) divide-se em várias direções. Assim, surgiu, emprimeiro lugar, a grande divisão do reino vegetal e do reino animal: as plantasacumulam diretamente a energia, para que os animais possam hauri-la nelase disponham da mesma como de matéria explosiva para a ação livre. As plantasestão ligadas à terra e, nelas, a consciência aindase encontra entorpecida; só desperta no mundo animal.

O élanvital subdivide-se ainda no mundo animal em duas direções diferentes,como se experimentasse dois métodos: numa direção culmina nos insetos sociais,na outra encontra seu acabamento no homem. Na primeira direção, a vida buscamobilidade e flexibilidade mediante oinstinto, ou seja, mediante a capacidadede utilizar ou até mesmo de criar instrumentos orgânicos; o instinto conheceseus objetos por simpatia, desde dentro, e age de modo infalível mas sempreuniforme. Ao invés, nos vertebrados desenvolve-se a inteligência, isto é, a faculdade de fabricar e utilizar instrumentosanorgânicos. 

Por sua essência profunda, a inteligência não se orienta para as coisas, mas para as relações, para as formas; conhece seu objeto só porfora. Contudo, suas formas vazias podem encher-se de inumeráveis objetivose indefinidamente. A Inteligência perfeita ultrapassa suas fronteiras primitivase pode até encontrar aplicação fora do campo prático, para o qual foi propriamentecriada.

Finalmente,aparece no homem, embora só em forma de fugazes arranques, a intuição, na qual o instinto se tornou desinteressadoe capaz de refletir sobre si mesmo. Além disso, o homem é livre. Todo estecurso evolutivo conduz, portanto, a libertação da consciência do homem, eeste aparece como o fim último da organização vital sobre o nosso planeta.

E. METAFÍSICA
Se o filósofo consente em mergulhar no oceanode vida que nos cerca, pode tentar conceber a gênese dos corpos e da inteligência.Esta intuição mostra que não só a vida e a consciência, mas a realidadeinteira é um devir. Não existem coisas, mas somenteações, e o ser é essencialmentedevir. "O devir encerra mais do que o ser". 

Só a nossa inteligência e , por conseguinte, a ciência nos representam os corpos como rígidos. Na realidade, o próprio mundo material é movimento, alor, embora certamente em descensoe dispersão. Com efeito existem no mundo duas espécies de movimento, ummovimento ascendente – o da vida – e outro movimento descendente – o da matéria.A lei da matéria é a lei da degradação da energia; a vida luta contra estalei, sem contudo poder aboli-la; quando muito, consegueretardar-lhe os efeitos.

Poderíamos compreender este processo, comparando-oao vapor que sai em jatos pelas fendas de um vaso. Este vapor em contato como ar livre condensa-se em pequenas gotas que caem. Mas uma pequena parte dovapor não se condensa imediatamente e esforça-se por elevar as gotas que caem.De modo idêntico, do imenso reservatório da vida saem incessantemente unscomo que jatos, cada um dos quais caindo forma um mundo; as gotas que caemsão a matéria. Ou, para empregar outra imagem, o mundo com o movimento vitalé comparável a um braço erguido que torna a cair, em conseqüência do relaxamentodos músculos: a matéria é como que um gesto criador que se desfaz. Mas estasimagens são insuficientes, porque a vida é do domínio psicológico e é inespacial.

Processoidêntico se passa na consciência. A Intuição tem a mesma direção que a vida,a inteligência tem a direção contrária. Por isso a inteligência está essencialmentecoordenada à matéria. A intuição, pelocontrário, mostra-nos a verdadeira realidade, na qual aparece a vida comoonda gigantesca que se espraia e logo em seguida é contida em quase toda suaamplitude. Só num ponto foi vencido o obstáculo e o impulso encontra livresaída. Esta liberdade aparece na forma humana. Pelo que, não sem razão, afilosofia afirmou a liberdade do espírito em geral, sua independência relativamentea matéria e sua provável sobrevivência após a morte.

Entretanto, a filosofia extraviou-se, por haver utilizado a inteligência e seus conceitos. Valendo-sede minuciosas análises, BERGSON mostracomo surgiu a idéia da desordem (a saber, da contingência das duasordens possíveis, a vital e a geométrica)e como se formou a idéia do nada, que é propriamente uma pseudo-idéia.BERGSON investe contra os maisimportantes sistemas filosóficos do passado.

A metafísica de PLATÃO e de ARISTÓTELES, seguindo a propensão naturalda inteligência, conseqüência dos conceitos que não fazem mais do que imitar a linguagem, subjugou a duração. Outro tanto acontece fundamentalmente, embora com diferenças de pormenor, nos sistemasmodernos, como os de DESCARTES, SPINOZA, LEIBNIZ, no criticismode KANTe principalmente em SPENCER. Neste último é onde semanifesta com particular evidência ocaráter cinematográficode nosso pensamento: pretendecaptar e representar a evolução por uma sucessão de estados do ser que sedesenvolve, e desconhece assim totalmente a verdadeira duração.

F. ÉTICA.
Segundo BERGSON, há duas espécies de moral,a moral fechada e a moral aberta. A moral fechada deriva dos fenômenosmais gerais da vida; consiste numa pressão exercida pela sociedade, e as açõesque lhe correspondem são levadas a cabo de modoautomático, instintivamente. Só em casos excepcionais se trava luta entreo eu individual e o social. A moral fechada é impessoal e triplamente fechada:visa a conservação dos costumes sociais, faz coincidir quase inteiramenteo individual com o social, de sorte que a alma se move constantemente dentrodo mesmo círculo, e, por último, é sempre função de um grupo limitado e nuncapode ser válida para a humanidade inteira, porque a coesão social, da qualé função, repousa em grande parte na necessidade de autodefesa.

A par destamoral fechada, que obriga absolutamente, existe amoral aberta. Esta aparece encarnada em personalidades. eminentes,em santos e heróis, e não é moral social, mas humana e pessoal. Não consistenuma pressão, mas num apelo; não é fixa, mas essencialmente progressiva ecriadora. É aberta no sentido que abarca a vida inteira no amor, proporcionaaté o sentimento da liberdade e coincide com o próprio princípio da vida.Procede de uma emoção profunda que, do mesmo modo que o sentimento provocadopela música, carece de objeto.

Todavia,na realidade nem a moral fechada nem a moral aberta se apresentam em formapura; toda aspiração procura consolidar-se numa obrigação e esta, por suavez, procura captar a aspiração. Estas duas forças, das quais uma é infra-intelectuale outra supra-intelectual, operam no campo da inteligência, e por isso omoral é uma vida racional.Como quer que seja, a moral fechada e a aberta constituem duas manifestaçõescomplementares do mesmo valor vital.

G. FILOSOFIA DA RELIGIÃO.
A mesma divisão que se fez na moral se aplica igualmentea religião: há uma religião estática e uma religião dinâmica. A religião  estática consiste numa reação defensiva da natureza contra os efeitosda atividade da inteligência, que ameaçam oprimir o indivíduo ou dissolvera sociedade. A religião estática prende o homem à vida e o indivíduoà sociedade mediante fábulas que se assemelham a canções de berço.A religião é obra da "função fabuladora" da inteligência. 

A inteligência,em sentido estrito, ameaça desfazer a coesão social, e a natureza não podeopor-lhe o instinto, cujo lugar foi precisamente substituído no homem pelainteligência. Mas a natureza ajuda-se mediante a produção da função fabuladora.Se o homem sabe, pela inteligência,que tem de morrer, coisa que o animal não sabe, e se a inteligêncialhe ensina que entre a tentativa e o êxito desejado existe o espaço desanimador do insondável, a natureza volta a ajudá-lo a suportar este conhecimento amargo, fabricando, graças a sua função fabuladora,deuses. O papel da função fabuladora nas sociedades humanas corresponde ao do instinto nas sociedades animais.

A religião dinâmica, o misticismo,é algo inteiramente diferente.Resulta deum retorno na direção donde procede o élan vital, enasce da pressentida captação do inacessível a quea vida aspira. Estemisticismo é próprio somente de homens extraordinários. Não se manifestou ainda entre os velhosgregos, como nem em forma perfeita na Índia, ondenão deixoude ser puramente especulativo. Contudo surgiu entreos grandes místicos cristãos, que possuíam uma saúde espiritual que se pode qualificar de perfeita. 

A religião cristã aparece como a cristalização deste misticismo, mas, por outro lado,constitui o seu fundamento, porque os místicos são todos imitadores originais, embora imperfeitos, daquele que nos deixou o Sermão da Montanha.

A experiência das místicos permite-nos defender não só aprobabilidade das concepções relativas à origem do élanvital, como também a afirmação da existênciade Deus, que não se pode provar com argumentos lógicos.
 
Os místicos ensinam também que deus é o amor,
e nada impede queos filósofos desenvolvam a idéia, 
sugerida por eles, de o mundo não ser mais 
do que um aspecto palpável deste amor 
e da necessidadedivina de amor.

A base da experiência dos místicos, 
corroborada pelas conclusões da psicologia,
pode igualmente afirmar-se, com uma probabilidade
que toca nas raias da, certeza, 
a sobrevivência após a morte.


Fonte:
CONSCIENCIA:ORG
http://www.consciencia.org/bergsonbochenski.shtml
Tradução de Antônio Pinto de Carvalho.
in A Filosofia Contemporânea Ocidental.
Sejam felizes todos os seres.
Vivam em paz todos os seres.
Sejam abençoados todos os seres.

Nenhum comentário:

Postar um comentário